terça-feira, 31 de julho de 2012

MORRE CHRIS MARKER





Morreu no último domingo, 29 de Julho, dia em que completou 91 anos, o cineasta, fotógrafo, escritor e filósofo francês Christian François Bouche-Villeneuve, mais conhecido pelo heterônimo de Chris Marker. Considerado um dos maiores expoentes do cinema ensaio, Marker reatualizou o “efeito Kulechov” reafirmando a importância da montagem na produção de sentidos no cinema. Sua composição fílmica, com narração subjetiva, propôs uma nova forma de ver, nos chamando a atenção para a força das imagens na construção dos sentidos, do confronto das imagens “recalcadas”, que giram direta ou indiretamente em torno dos acontecimentos, produzindo analogias em diferentes contextos.

Chris Marker fez parte de um grupo de documentaristas composto por Agnès Varda e Alain Resnais, que começaram a fazer cinema antes do surgimento da Nouvelle Vague. Também conhecido como grupo da “margem esquerda” do Senna, eles tinham um grande envolvimento com a literatura e as artes plásticas e uma concepção diferente do fazer cinema, que os distanciavam do grupo da “margem direita”, ou seja, o grupo Godard-Truffaut, do Cahiers Du Cinema.

Como o poeta Fernando Pessoa, o cineasta assinava suas obras inventando uma multiplicidade de colaboradores, criando heterônimos como Jacopo Berenzini, Michel Krasna, Hayao Yamaneko, entre outros. Múltiplo por excelência, Marker era um realizador que fazia filmes sozinho, escrevendo roteiros, fotografando, filmando e editando. Foi na elaboração de livros que Marker aprendeu a montagem cinematográfica. No livro de foto-ensaio “Les Coréennes” (1958), propôs uma nova sintaxe visual, transportada posteriormente para os filmes. Sua obra prima de ficção, La Jetèe (1962), em que um viajante do tempo tenta evitar a eclosão da terceira guerra mundial, foi realizado com fotomontagem. O curta serviu de inspiração para o longa “Os 12 macacos”, de Terry Gilliam, protagonizado por Bruce Willis e Madeleine Stowe.

O foco da obra de Marker foi o documentário. Entre os destaques, Dimanche à Pequin (1955), Lettre de Sibérie (1958), Fond de l’Air est Rouge (1978) e Sans Soleil (1982), em que apresenta forma de narrativa epistolar, com suas inflexões pessoais, construindo associações, como um verdadeiro escritor. A revolução cubana, a União Soviética e o comunismo chinês, a guerra do Vietnã, o maio de 68 na França, a ditadura no Chile, as lutas dos trabalhadores, as lutas pela emancipação e independência, e o poder da mídia foram alguns dos temas de seus filmes. O cineasta buscava a reflexão das realidades e por isso mesmo era alvo da censura da época, em vários países. Em seus filmes não existe uma ordem cronológica linear, mas sim pontes imagéticas entre tempos e espaços distintos. Introduz a literatura na imagem. Usa o jogo dos contrastes, colando texto e imagem numa montagem paralela, fazendo metáforas, comparações, composições, onde sempre inclui a presença de animais. Também usava em suas obras imagens de arquivo, fotos, animações, efeitos visuais e sonoros. Gostava de incluir em seus trabalhos novas experimentações estéticas e tecnológicas, como instalações multimídia.

Os ensaios fílmicos de Marker talvez tenham correspondido de forma mais próxima à famosa profecia de Alexandre Astruc, do nascimento da vanguarda da Caméra stylo, ou seja, do cinema como meio de expressão tão flexível e sutil como a linguagem escrita.  Chris Marker não buscava a objetividade, porque para ele a verdade não era mais que um artifício, pois não é unívoca. Através da câmera ele poderia exprimir sua subjetividade, lançando um olhar crítico sobre os fatos. A imagem depende do contexto e não se limita a ser uma fotografia em movimento. A imagem é uma informação aberta, múltipla, simultânea, que materializa algo que não está materializado. Contém perguntas e nem sempre respostas. Em Le Fond de l’Air est Rouge, por exemplo, apresenta toda a insatisfação que levou ao movimento de maio de 1968.

O cineasta travou parcerias com Alain Resnais, Jean Luc Godard e Costa Gravas. Conquistou o Urso de Ouro no Festival de Berlim por “Description d’um combat” (1961), uma coprodução França-Israel, e em 1963 recebeu o prêmio especial por “Le Joli mai”, no Festival de Veneza. Dirigiu 52 filmes, entre curtas, longas e documentários para a TV. Seu último trabalho foi o curta “Leila Attacks” (2007).



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