Polêmicas à parte, a festa do Oscar 2016 não surpreendeu, apesar dos favoritismos. Com seis estatuetas (melhor figurino, desenho de produção, maquiagem e penteado, montagem, edição de som e mixagem de som) “MAD MAX: A ESTRADA DA FÚRIA”, de George Muller, foi o grande vencedor da noite. Pra quem torcia pelo filme de Alejandro González Íñárritu, “O REGRESSO”, que levou os prêmios de melhor diretor, fotografia e melhor ator para Leonardo Di Caprio, ficou a frustração de perder a estatueta de melhor filme para “SPOTLIGHT: SEGREDOS REVELADOS”, que também venceu na categoria de melhor roteiro original.
É inegável que SPOTLIGHT, de Thomas McCarthy, é um grande filme, abordando um tema forte [denúncia de abuso sexual de menores por padres pedófilos], mas o prêmio de melhor filme é direcionado para o trabalho de produção. E o filme de Íñarritu, tanto quanto o de Muller, superam a obra de McCarthy neste quesito. Enquanto O REGRESSO foi todo rodado nas florestas e montanhas do Canadá e Argentina, recriando as condições inóspitas de um mundo perdido e recuperando a cultura indígena e dos exploradores do ínicio do século XIX - MAD MAX: A ESTRADA DA FÚRIA possui um cenário pós-apocalíptico, com locações na Namíbia, Austrália e África do Sul. Os dois filmes exigiram um grande trabalho de produção, apresentando sequencias surpreendentes, evitando-se ao máximo o uso de efeitos especiais.
É certo que SPOTLIGHT foi o grande vencedor do Independent Spirit Award, do Critic Choice Award (Prêmio dos Críticos) e do SAG Awards (o prêmio do Sindicato dos Atores), o que já era um indicativo de que poderia ser o vencedor do Oscar, já que a Academia gosta de premiar filmes baseados em histórias reais, como o da reportagem da equipe investigativa do The Boston Globe. E que A GRANDE APOSTA (oscar de melhor roteiro adaptado), que aborda a crise econômica mundial originada pela crise dos subprimes, no mercado hipotecário norte-americano, foi escolhido como melhor filme pelo PGA Awards (Sindicato dos Produtores). Entretanto, O REGRESSO havia levado o prêmio máximo no BAFTA, no Globo de Ouro e no DGA – Director Guild of America (Sindicato dos Diretores), fazendo com que a disputa ficasse ainda mais acirrada.
Parece que a Academia apenas corroborou a tendência de premiar filmes polêmicos, com um cunho político. E por falar em política, o racismo em Hollywood foi o tema central da cerimônia deste ano. Apesar das piadas sem graça do apresentador Chris Rock sobre a controvérsia em torno da não indicação de negros, ele declarou que “nem tudo é racismo ou sexismo”. Rock criticou abertamente o posicionamento dos atores Will Smith, Jada Smith e do cineasta negro Spike Lee, de boicotar a maior festa do cinema americano, revelando a pressão que sofreu para não aceitar a apresentação oficial do evento. De certo modo, ele minimizou o posicionamento dos colegas de profissão frente ao racismo escancarado de Hollywood. Relembrou que nos anos 60 a não indicação de negros ao Oscar não era motivo de controvérsias, já que o movimento negro tinha coisas mais importantes para protestar. Com ironia, enfatizou que “se quiserem os negros todos os anos, poderiam criar categorias sob medida: por exemplo, melhor amigo negro”. Ao final do monólogo de abertura da cerimônia, ele declarou: “Não se trata de boicotar: queremos oportunidades. Queremos as mesmas oportunidades que os atores brancos. Nada mais”.
Durante o evento, Rock apresentou a esquete “Mês da história negra”, em que a atriz Angela Basset fez uma homenagem ao ator branco Jack Black, que assim como Will Smith, atuou em “Inimigo do Estado” e “Shark Tale”, num ataque frontal ao ator afrodescendente. Chris Rock também entrevistou populares para saber se os filmes indicados, com atores brancos, eram ou não os mais vistos, perguntando sobre a distribuição de papeis para atores negros, latinos e brancos. Também parodiou cenas dos filmes indicados, com a presença de Whoopi Goldberg, Leslie Jones e Tracy Morgan, que tentavam conseguir os papeis destinados a atores brancos, mostrando que uma das faces do racismo é a não inclusão nos papeis principais.
A presidente da Academia, Cheryl Boone Isaacs, uma mulher negra, fez um pronunciamento sobre o futuro e a importância de oportunidades iguais em Hollywood. Declarou a responsabilidade dos membros da Academia como forma de influenciar a industria cinematográfica e o comportamento das sociedades. Ela reiterou que é necessário não apenas concordar, mas agir, promovendo a diversidade. Relembrou a luta de Martin Luther King afirmando que mudanças podem ser difíceis, mas necessárias.
Voltando às premiações, a Academia confirmou os favoritos para melhor atriz, Brie Larson (O QUARTO DE JACK), e melhor atriz coadjuvante para Alicia Vikander (A GAROTA DINAMARQUESA). Apesar da torcida brasileira para Silvester Stallone, por sua atuação como Rocky Balboa em CREED, o prêmio de melhor ator coadjuvante foi para Mark Rylance (A PONTE DOS ESPIÕES).
Outros prêmios da noite foram: melhor canção original “Writing’s on the wall”, interpretada por Sam Smith (007 CONTRA SPECTRE); melhor documentário AMY, sobre a vida e trajetória da cantora britânica Amy Winehouse; melhor documentário em curta metragem A GIRL IN THE RIVER: THE PRICE OF FORGIVENESS, sobre os chamados “crimes de honra” contra mulheres paquistanesas; melhor efeitos visuais para o longa britânico EX MACHINA, uma ficção científica e de suspense sobre um androide com inteligência artificial; o prêmio de melhor filme estrangeiro foi para O FILHO DE SAUL, produção húngara sobre o tema do holocausto; e o melhor curta metragem, STUTTERET, filme britânico que narra a estória de um rapaz gago, que se relaciona com uma jovem pela internet e teme pela rejeição ao se encontrarem pessoalmente.
Ainda não foi desta vez que o Brasil levou a estatueta. O representante brasileiro na categoria melhor animação (longa) O MENINO E O MUNDO perdeu para o favorito DIVERTIDA MENTE, da Pixar. O filme de Alê Abreu era realmente mais poético que o vencedor do Oscar, mas dificilmente desbancaria a animação de um grande estúdio norte-americano. É importante lembrar que O MENINO E O MUNDO, um filme independente, conquistou o prêmio Cristal do 38º Festival de Animação de Annecy, na França, considerado o maior prêmio da animação mundial. Outro premiado da noite, na categoria curta de animação foi o chileno BEAR STORY, sobre a estória de um urso de circo que anseia escapar e voltar para sua família.
Um dos momentos mais emocionantes da cerimônia foi a premiação de Ênio Morricone, finalmente justiçado pela Academia, recebendo a estatueta pela trilha sonora de OS OITO ODIADOS, filme de Quetin Tarantino. O maestro, que aguardava ao lado do amigo John Williams, foi aplaudido de pé pela plateia que lotava o teatro Dolby, em Los Angeles.
Outros destaques da 88ª edição do Oscar foram: a apresentação ao piano de Lady Gaga, que concorria ao oscar de melhor canção por “Til it happens to you” do documentário HUNTING GROUND, com a presença de pessoas que sofreram abuso sexual em campi de universidades norte-americanas; e a homenagem in memorian, com a performance “Blackbird”, canção dos Beatles, interpretada por Dave Grohl, do Foo Fighters (ex- Nirvana). Entre os artistas falecidos, o cineasta italiano Ettore Scola, os atores Omar Shariff, Maureen O’Hara, Leonard Nimoy, Alan Rickman e o cantor e ator David Bowie.
Elisabete Estumano Freire.
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